Giacomello avalia desafios e emoções da luta pelo título: "Só eu sei o que senti dentro do capa
- Bernardo Bercht
- 12 de nov. de 2015
- 7 min de leitura

Está chegando a hora da decisão da Fórmula RS, numa das finais mais disputadas da década. Marcelo Giacomello da Scuderia Macchina lidera o campeonato, mas enfrenta perseguição furiosa do piloto Novosul Power, Lucas Alves, de Pelotas. O título gaúcho de monopostos deve ser definido apenas na última bandeirada do ano e trazemos as expectativas do piloto de Bento Gonçalves para a decisão.
Giacomello comenta o ano que mostrou seu melhor na Fórmula RS, mas que também foi o de mais dura competição. Os desafios técnicos e um pouco da emoção de cada disputa, do ponto de vista do piloto e sua relação com a equipe, estão transmitidos na entrevista abaixo.

Esse campeonato tem um diferencial para os outros anos. A disputa demorou em se "polarizar" e chegou a ter quatro concorrentes diretos. Respondo com uma pergunta: E existe ano fácil quando se está nas pistas correndo contra os melhores? Este ano realmente se apresentou de maneira diferenciada quanto à competitividade do grid como um todo, com mais pilotos para dividir os pontos de cada etapa. De certa maneira, foi um cenário que nos levou a olharmos muito mais para dentro do box do que para fora dele.
É um ano difícil para resolver tentar ser campeão? Quando se tem como única adversária pelo título uma equipe consagrada e multi-campeã, com um piloto indiscutivelmente diferenciado - como é o caso dos anos anteriores em que estivemos correndo praticamente contra a equipe Stedile - você acaba olhando para o desempenho do adversário e se comparando com ele. Sabe se é mais rápido, se contorna uma curva melhor ou pior, onde ele troca marchas, qual é o traçado dele, ponto de reaceleração, sabe quase tudo sobre seu oponente. E tenta se comparar para melhorar nos pontos onde vê que está perdendo. Quando você se vê num grid que apresenta quatro pilotos rápidos, dominando as etapas com desempenho muito semelhante, você passa a se questionar mais sobre “qual é o meu limite”, “até onde eu posso chegar”. Passa mais tempo comparando você com você mesmo, e não mais com o oponente. Desta forma, quando acaba uma corrida em que sabe que fez o seu melhor, que a equipe lhe entregou um carro na melhor condição a qual ela estava apta a entregar, se sente muito satisfeito, independentemente do seu resultado, ou do resultado dos seus adversários. Então, de certa forma, este campeonato tem trazido mais alegrias pra equipe como um todo, do que quando nos focávamos em superar um único carro.
Você mudou algum tipo de estratégia em relação aos outros anos?

A maior mudança de estratégia foi o que comentei na resposta anterior, passamos a procurar ultrapassar nossos próprios limites, independentemente dos parâmetros dos adversários. E esse foi o maior amadurecimento que poderíamos ter. O que estava faltando para chegarmos ao final de cada domingo de corrida com um sorriso no rosto e a sensação de dever cumprido. De resto, nenhuma estratégia foi mudada em relação aos outros anos, afinal sempre estivemos disputando a ponta, então é inteligente manter o que, ao nosso ver, está dando certo.
A preparação do time está mais completa em 2015? Foi possível reparar que terminaram muito mais corridas entre os três primeiros. Realmente estamos com o carro em um nível de desenvolvimento bastante interessante, e a receita para isso se resume em três palavras: trabalho, trabalho e trabalho. Das últimas 30 baterias que fizemos, estivemos no top 3 por 28 vezes, oito delas no lugar mais alto do pódio. A confiabilidade e a velocidade do nosso carro vêm de algo que aprendemos fora da pista, com as Lojas Benoit, nosso patrocinador: Equipes de alto desempenho só atingem este nível se contarem com os melhores e mais treinados profissionais que o mercado possa oferecer. Crie-os ou contrate-os. Como funciona essa qualificação do time? Dentro das nossas possibilidades, levamos essa premissa adiante e nos cercamos daqueles que, na nossa visão, além de estarem identificados com os nossos valores de trabalho sério e honesto em busca das vitórias, são os melhores profissionais que o mercado do automobilismo gaúcho pode nos oferecer. Para isso trouxemos profissionais como o André Rebechi para fazer o carro, Rafael Cardoso (Motorcar) para cuidar do motor, Eduardo Rodrigues (Rodrigues Racing) para a caixa de câmbio, além dos nossos próprios mecânicos Roberto Segatto e Solimar Gotuzzo, que são reconhecidos nos boxes de todos os adversários como exemplos de dedicação, comprometimento, competência e entrega à nossa equipe. Entre uma corrida e outra, o carro é desmontado quase que por completo, e cada parafuso, abraçadeira, mangueira, cabo elétrico ou outro componente é revisado. Nosso pessoal conta com equipamentos e conhecimento suficientes para eu ter certeza de que sempre que eu sentar no carro, chegou a minha hora de dar meu máximo, porque tudo o que podia ser feito por mim, foi feito da melhor forma.

Rivera foi um fim de semana bem diferenciado. Muitos problemas, o Carlos ausente.. Como foi a montanha russa lá e o que o time fez para superar? Rivera foi um ponto absolutamente fora da curva, um fim de semana que não devemos, nem podemos esquecer, mas sim procurar aprender com ele. Já na sexta feira quebramos caixa de câmbio, três amortecedores e uma balança traseira. No sábado foi a vez de quebrarmos coletor de escapamento e incendiarmos o carro com um motor explodido em pleno treino classificatório. Um inferno que testou todo e qualquer limite de trabalho em equipe e união do pessoal. Três dias que provaram para nós mesmos que, às vezes, desconhecemos a real força que uma equipe pode atingir quando trabalha junta, com foco em um único objetivo. Estávamos em outro país, sem a presença do meu pai, que para mim é a principal referência fora da pista, com recursos limitados em virtude das instalações dos boxes naquele autódromo, e precisamos praticamente construir um carro novo para a corrida. Nunca dois terceiros lugares foram tão comemorados. Mas também nunca trabalhamos tanto com o carro na garagem depois de uma corrida como trabalhamos depois de Rivera. Posso assegurar que avançamos mais um degrau no nosso padrão de trabalho das revisões pós etapas. Ficamos mais fortes e confiáveis.
Mais difícil disputar ponto a ponto com um cara que sabe tudo de Fórmula como o Fernando, mas que já tem título, ou com a gurizada esfomeada e louca por vitórias, como Rouver e Alves? Acima de tudo, o prazer que sinto em disputar corridas de carro, independentemente do adversário, é sempre igual, na máxima intensidade. Quanto à dificuldade, acredito que sejam apenas diferentes. A dificuldade em disputar com o Fernando vem muito em virtude de aprendermos que ele nunca, em hipótese alguma, vai falhar. Devemos considerar que a equipe vai deixar o carro dele sempre perfeito, e ele vai sempre ter uma tocada perfeita, a cada metro de pista que percorrer. Aprendemos na prática que temos que ultrapassar a perfeição antes de pensar em ultrapassar o carro amarelo #9. Já disputar com pilotos jovens e cheios de energia como o Matheus, e especialmente o Lucas, traz desafios diferentes, pois você encontra um adversário no começo da temporada, e outro adversário completamente diferente, mais rápido, consistente e maduro a cada etapa que se passa.

Nessa reta final, foi o estreante Alves que mais se destacou. Acendeu um alerta? Nossa disputa se polarizou com o Lucas e, em virtude disso, hoje acompanho muito mais o trabalho e os resultados dele e da Novosul Power do que de outros adversários. Ver um piloto tão jovem ter uma evolução tão grande em tão pouco tempo, é mais uma prova da inegável capacidade que a categoria tem em formar esses jovens e preparar para categorias maiores mundo afora. Modestamente, considero nossa equipe a principal adversária destes jovens nesta temporada, e sinto orgulho de estarmos colaborando diretamente para uma verdadeira “escola de campeões” acontecer na prática.

E a vitória em Tarumã? Sem estar com o motor titular, depois de sair da pista... Conta mais sobre aquela disputa A vitória em Tarumã foi especial. Não só pelas circunstâncias de estar com o aerofólio dianteiro quebrado depois de uma saída de pista, e estar utilizando o motor reserva depois de ter perdido o titular em Rivera e não ter verbas para construir um novo. Mas também em virtude de desde a metade da temporada, não sermos o carro mais rápido na pista. A evolução do Lucas e da equipe dele acabou fazendo com que a tabela de pontos mostre uma visão distorcida do que está ocorrendo na pista. Estamos liderando o campeonato desde a primeira etapa, porém nosso principal adversário desde a metade do ano tem um conjunto que está cerca de 0,5s por volta mais rápido que o nosso conjunto. Então ter um equipamento com a confiabilidade que nos possibilite aproveitar as circunstâncias e voltar a vencer corridas sem sermos os mais rápidos, premia o trabalho forte de toda uma equipe que está empenhada em lutar pelo título até o último milímetro de pista da última corrida.
Adicionalmente ao nosso trabalho, eu saí do carro com uma opinião, e sigo com a mesma desde então: o cara lá em cima tem o dedo nisso tudo que aconteceu em Tarumã. Senti isso dentro do carro, durante a pilotagem, e só eu sei o que significou para mim, dentro do capacete, sentir o que eu senti. Não sei explicar.

Vamos projetar a finalíssima. Está preparando algo em especial, não só de carro, mas mentalmente? Traçou uma estratégia? Quem vem acompanhando as atividades de pista da segunda metade da temporada da F-RS tem visto que, embora tenhamos um conjunto bastante sólido, o que nos possibilita acreditarmos fortemente que somos capazes de ser campeões, somos atualmente a segunda força da categoria em termos de desempenho. Acredito, portanto, que a luta será realmente muito intensa com o Lucas e sua equipe. A estratégia para a final não é diferente da estratégia adotada no resto do ano, e muito menos diferente de toda a história de mais de 30 anos da equipe e, particularmente, da família Giacomello: trabalho dedicado, seriedade, valorização do investimento do patrocinador e princípios corretos acima da vontade de vencer a qualquer custo.
Mesmo tendo a vantagem nos pontos, não se considera favorito? Em condições normais de pista, o conjunto do adversário o torna favorito, e possibilita plenamente a ele fazer o resultado que o deixa com o título, independente dos nossos resultados. Porém também sabemos os motivos pelos quais chegamos por três temporadas na etapa final vivos na disputa pelo título, e do potencial que temos para lutar de maneira focada e competitiva até o final.
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